- Crucius... Crucius... Acorde...
Ao som desta voz doce e gentil, os
olhos de Crucius se abriam rapidamente, mas sua percepção de espaço foi
voltando de forma lenta e gradual, fazendo a claridade e confusão de luzes se
encaixarem em formas, o silêncio aos poucos ser tomado por ruídos e sons e sua
pele sentir arrepios do vento que deslizava por seu corpo e penetrava pelas
frestas de suas vestes rasgadas e sujas.
Levantou-se sentindo seu corpo
pesado, e enquanto sua consciência voltava vagarosamente, observou o ambiente
para se localizar, e se viu no alto de uma montanha pedregosa, onde o vento
cantava uma melodia gélida e arrepiante. Aparentemente não havia sinal de vida,
mas sentiu que a trama da realidade era mais fina naquele local. O Sol se
ocultava pela densa neblina, mas pela sua localização ele notava que ainda era
manhã.
Não encontrou boa parte de seus
pertences, mas sua espada Rainha Vermelha estava cravada no chão próxima a ele,
como se estivesse o observando e protegendo durante o tempo que esteve
desacordado. Quando apanhou sua companheira, notou que aos pés dela havia uma
inscrição cravada na pedra. Havia o número “XIII” cravado a lâmina e
rusticamente no solo, e pelo que podia notar não havia sido feito a mais que
dose horas atrás.
Dores pareciam competir por
atenção no seu corpo, mas se esforçou para ignorá-las e lembrar como fora parar
naquele local. Por maior que fosse o esforço que fazia, quando tentava voltar ao
que aconteceu se via em um deserto de memórias fragmentadas. Lembrou de um
combate violento, mas não conseguia enxergar com quem se digladiava, lembrou de
um olhar encantador que aquecia seu coração mas não sabia a quem pertencia, e
também de uma risada forte e voraz, que fervia seu sangue com fúria.
Tentou encontrar respostas
enquanto caminhava, mas em pouco tempo percebeu que não as encontraria. Seja lá
o que havia acontecido, era como se parte de sua memória havia sido bloqueada e
em seu coração sabia que coisas muito importantes precisavam ser recuperadas. Quando
deu por si estava diante de uma pequena queda d’água, e sentiu que um bom banho
poderia purificar sua mente e corpo, e mergulhou sem sua roupa, deixando apenas
sua espada a mão. Nunca houvera provado algo como aquilo, pois a água cristalina
e brilhante parecia restaurar suas energias e trazer uma paz que a muito não
sentia. Revigorando suas forças. Sentiu uma estranha presença que o observava,
que o fez empunhar a Rainha Vermelha rapidamente. Não havia nada hostil ao seu
redor, apenas as pedras e a vegetação que o cercava. Questionou se não estaria
Aos poucos a temperatura fria
começou a incomodar, a água começou a tomar um tom escuro, o odor e o sabor putrificou
e sentiu brotar do solo sob seus pés uma sensação que conhecia muito bem –
Restos de corpos humanos. Sentiu que deveria se deslocar, mas mas seu corpo foi
rapidamente envolto por tentáculos viscosos e fortes que o seguraram no solo. Viu
emergir diante dele uma enorme criatura, com uma pele escamosa e verde, um par
de braços esguios que se prolongavam até garras pontiagudas, uma bocarra
repleta de dentes protuberantes, olhos escuros e frios como de um réptil, e
vários tentáculos que se debatiam velozmente brotando de suas costas. Aquele
cenário belo ficou cheio de pedaços de corpos, que boiavam naquela água com
cheiro de morte, onde a criatura hostil fitava para Crucius com um olhar sedento.
- Terá que pagar o preço por se
banhar em meu território humano. Quero sua carne!
Crucius encarava a criatura
imóvel e impassível, analisando sua postura arrogante e esperando seu próximo
movimento. Sabia que a criatura estava confiante, e esse seria seu trunfo.
Quando apertou firmemente o cabo de sua espada para dilacerar os tentáculos que
o prendiam e poder se libertar, viu uma flecha furtiva atingir o olho da
criatura, fazendo-a gritar de dor. Com o golpe certeiro a criatura se distraiu,
e em um único golpe Crucius decepou os membros viscosos que o seguravam, e
antes que a criatura percebesse, um vulto emergiu da água separando sua cabeça
do corpo. Seu sangue verde e gosmento jorrava de seu pescoço, e desmoronou sem
vida na água. Crucius chegou a margem nu, de espada em punho procurando de onde
viera aquela flecha amiga.
- Deve tomar cuidado com as
belezas desta montanha forasteiro, algumas podem ser fatais.
Por entre as folhas surgiu um
homem baixo, de pele escura como a terra mais fértil, vestes que simulavam a
vegetação e um arco em punho. Sua face lembrava um guaxinim, com olhos
profundos e escuros e uma barba rala que moldurava uma boca risonha e
debochada.
- Obrigado pela ajud...
- Não! Sou Marvin, e antes de
qualquer coisa se vista. Não tenho o hábito de conversar com homens nus.